A Justiça do Rio de Janeiro condenou a farmacêutica AstraZeneca a pagar uma indenização de R$ 3,75 milhões aos pais e ao irmão de Thais Possati, uma promotora de Justiça de Niterói, no Rio, que morreu depois de tomar a vacina Oxford/AstraZeneca contra a Covid-19 enquanto estava grávida. A decisão foi confirmada no fim de junho pela 3ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do RJ. As informações são da Gazeta do Povo.
Thais, que estava no segundo trimestre da gestação, precisou ser internada poucos dias após a vacinação com dores abdominais e recebeu o diagnóstico de trombose venosa profunda e trombocitopenia. Ela e o bebê não resistiram e faleceram.
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Na época em que ela foi vacinada, em maio de 2021, o Ministério da Saúde ainda não tinha contraindicações formais sobre o uso da vacina em gestantes. Mesmo assim, a família decidiu ir à Justiça alegando que a fabricante deveria ter alertado sobre os possíveis riscos do imunizante para grávidas.
“A obrigação do fabricante é o dever de informar”, afirmou a desembargadora Marianna Fux, responsável pela decisão. Ela destacou que o fornecedor precisa dar “esclarecimentos ostensivos e adequados a respeito da nocividade ou periculosidade do produto” para garantir a transparência e permitir uma escolha consciente.
De acordo com o processo, a farmacêutica já tinha informações sobre possíveis reações adversas antes mesmo de Thais ser vacinada. “Em 11/03/21, mais de um mês antes da vacina aplicada na gestante, o seu uso foi suspenso na Dinamarca e Noruega, em razão do aparecimento de casos de síndrome de trombose com trombocitopenia, conforme relatou o perito médico no laudo produzido nos autos”, destaca a decisão.
A magistrada ressaltou que “a ré já tinha informações sobre o desenvolvimento da doença em outros países” e que mudanças na bula ou simples comunicações à Anvisa não seriam suficientes para informar o público de forma clara e adequada.
“Não há, assim, nos autos, prova de que na data da vacinação havia sido dada publicidade suficiente à reação adversa (Síndrome de Trombose com Trombocitopenia), em cristalina violação ao dever de informação qualificado do fabricante, impossibilitando que a gestante fizesse escolha consciente acerca do risco x benefício de se vacinar.”
Durante o processo, a AstraZeneca defendeu-se dizendo que não havia provas de que a vacina foi a causa da morte e afirmou ter seguido todas as normas regulatórias vigentes.
Em primeira instância, a empresa havia sido condenada a pagar R$ 1,1 milhão, mas o valor foi aumentado para R$ 3,75 milhões na decisão mais recente: R$ 1,5 milhão para cada um dos pais de Thais e R$ 750 mil para o irmão dela.
Primeira gestante brasileira a morrer após vacina da Covid
Thais Possati entrou para a história como a primeira gestante brasileira a morrer após receber uma dose da vacina contra a Covid-19. O juiz Mauro Nicolau Junior, que julgou o caso na primeira instância, afirmou que “houve verificação do defeito dois meses antes da aplicação da vítima em apreço e, ainda assim, ciente do ocorrido, a ré optou por manter o imunizante no mercado, de modo a gerar o dever de indenizar, pautado na responsabilidade civil objetiva.”
Depois da tragédia, o governo federal suspendeu a aplicação da vacina Oxford/AstraZeneca em gestantes e o próprio laboratório reconheceu que não havia realizado testes do imunizante em grávidas.
O relatório médico anexado ao processo trouxe detalhes do sofrimento de Thais. Ela estava com 23 semanas de gestação quando foi vacinada e, já no dia seguinte, começou a apresentar complicações que evoluíram rapidamente. A gestante teve um Acidente Vascular Cerebral (AVC) hemorrágico associado à trombose e faleceu no mês seguinte.
“Thais e o bebê passaram por elevado sofrimento”, diz o laudo médico incluído nos autos.
A decisão reacende o debate sobre os riscos, benefícios e deveres de transparência das farmacêuticas, especialmente em situações emergenciais como a pandemia.